A vida não foi mais a mesma para 21 moradores de Domingos Martins depois do dia 20 de julho de 2007. A data marca o desabamento de um edifício de quatro andares localizado na Rodovia Francisco Christ Sobrinho, em Santa Isabel, na região Serrana do Espírito Santo.
A tragédia matou uma mulher e uma criança de apenas sete anos e deixou outras 19 pessoas feridas e desabrigadas. Até hoje, ninguém foi punido pelo crime e os cidadãos não foram ressarcidos pelas perdas materiais, e nem pelos danos físicos e psicológicos. Todos seguem sem respostas.
As duas vítimas fatais são a mãe e o sobrinho da dona de casa Ramilla Surno de Pret.
No dia do acidente, ela conta que todos estavam dormindo. Já era tarde e no dia seguinte ela iria se casar. O doce e esperado casamento. Até que o sono e os sonhos foram interrompidos por um barulho e impacto fortes.
“Foi tipo um trovão. Acordei no susto e estava asfixiada pela poeira. Todos estávamos soterrados. Eu fui perdendo a consciência, mas escutei gritos por socorro”, relata.
Para a avó e o neto, infelizmente, o pedido de ajuda foi silenciado pelos escombros. E em questão de segundos, não foi possível mais ouvir as vozes.
“Foi um choque para mim saber que eles estavam mortos. A gente nunca espera isso de pessoas tão importantes na nossa trajetória. Tive que aprender a lidar com as perdas muito nova. Na época, eu só tinha 21 anos. Digamos que hoje eu esteja sobrevivendo. Convivi, por muito tempo, com a depressão. Mas tudo, desde aquela noite, é mais ou menos. Eu só gostaria que a justiça fosse feita”, desabafa.
Eu penso que a minha vida e a da minha família não valem nada.
Rita de Cássia de Souza, vítima do desabamento
São com essas palavras que a professora Rita de Cássia de Souza – mais uma vítima do desmoronamento do prédio – descreve o sentimento de descaso por parte dos responsáveis pela construção dele e do poder público em dar seguimento ao processo para puni-los.
Há 14 anos, ela viu seus planos futuros desmoronarem junto com a estrutura que dava sustentação aos apartamentos. Perdeu a casa, os amigos, e as lembranças. Restaram as dores e os traumas.
“É muito descaso. Chega o mês de julho, e eu e meus filhos já não conseguimos mais dormir. Eu tenho medo. Fecho os olhos e revivo aquele dia. Estamos traumatizados. Parte da minha história ficou enterrada naquela terra, inclusive fotos da infância. Desenvolvi ainda problemas na coluna. Na hora que o imóvel veio à baixo e eu olhei para o lado e vi as minhas crianças, só agradeci a Deus pela vida deles”, desabafa.
Rita declara ainda que adorava morar no local, apesar de ser alugado. O edifício era novo e não aparentava oferecer riscos de queda.
Sobre o edifício e os acusados
O edifício residencial era arrendado para famílias da região. E no último andar, funcionava uma academia de ginástica. Segundo apontam as investigações, esse pavimento é o responsável por ocasionar danos à estrutura, que não suportava a construção.
“Consta laudo pericial que conclui, definitivamente, pela responsabilização da academia de ginástica que funcionava no quarto andar do edifício que desabou e deu ensejo a todas as ações cíveis e àquela criminal, sendo que em todas as ações cíveis houve despacho que determinou o traslado do referido laudo como prova documental e ainda ao verificar os autos da ação criminal, especificamente as fls. 793/797, tem-se Decisão da MMª Juíza da Vara Criminal, onde a mesma o faz ao final da seguinte forma ‘portanto, ficou devidamente caracterizado a ciência pela Sra. Maria Trabach do imóvel para utilização de uma academia em um imóvel que tinha destinação exclusiva de cunho residencial'”, diz parte do processo que tramita no Tribunal de Justiça do Espírito Santo (TJ-ES), comarca de Domingos Martins.
Atualmente, o terreno está vazio, coberto apenas pelo mato e pela poeira.
Terreno do antigo edifício que desabou em Santa Isabel, Domingos Martins Terreno do antigo edifício que desabou em Santa Isabel, Domingos Martins Terreno do antigo edifício que desabou em Santa Isabel, Domingos Martins
Sergio Roberto Helmer – o proprietário do imóvel, Valéria Medeiros de Almeida – engenheira encarregada da obra, e o município de Domingos Martins respondem pelos crimes e ações indenizatórias.
O que diz a Justiça
O processo que julga a responsabilidade civil e penal pelo desmoronamento do prédio foi suspenso em 2019. Após este período, protocoladas petições, sendo a última em maio. O Tribunal de Justiça, contudo, não informou o motivo da interrupção do julgamento.
Karen Benicio
Equipe de jornalismo do MovNews
Infelizmente convivemos com um justiça letárgica. Que te cansa e te faz desistir da busca pela própria justiça pelos meios legais.
14 anos em um processo com claras evidências de negligência e irresponsabilidade que resultou em mortes de pessoas inocentes.
Há 14 anos aguardamos um julgamento honesto e o ressarcimentos de bens que são indisponíveis e inegociáveis.
Lidamos com a dor de perder entes queridos e buscamos na justiça um alivio para que possa ao menos reparar os danos materiais, mas como se vê, 14 anos se passaram e muitos ao menos sebe em que pé está o processo.
É um total descaso para com os seus.
Infelizmente, esperar justiça em um meio tão celetista como desse judiciário que ai está é quase que utópico.
Judiciário que se diz tão representativo. Uma falácia sem tamanho.