A luz e a sombra são passageiras do infinito.
Li Bo
Durante séculos e milênios, filósofos, cientistas e religiosos, em vários momentos, culturas e civilizações, acreditaram que o universo, criado por um ente superior ou por acaso, era fixo, permanente, as estrelas, o sol, a lua, a terra, desfilando nos céus, ano após ano, em suas trajetórias regulares e repetitivas. O tempo, em seu perpétuo retorno ao mesmo, ou apontando para a sua concretização ou palusia final, se realizava em uma natureza e espaço estelar completo, definitivo, apenas alterado superficialmente, no mundo sublunar, pelas ações e intervenções humanas.
A descoberta que o universo está em uma constante expansão, sem limites, que os buracos negros fazem desaparecer estrelas inteiras, e que exploração predatória do planeta pode ocasionar o fim da humanidade, fizeram duvidar da crença na estabilidade universal, mantida desde a sua criação ao seu fim. O Big Bang deu início, deu partida a esta aventura singular, o fez sem implantar uma ordem prematura do universo, mas o produziu dotado um destino instável, onde os acasos localizados ou explosões estelares, tornam imponderável o seu desenvolvimento futuro e a sobrevivência dos pobres e infelizes mortais que habitam a periferia de uma pequena estrela.
Quando pela primeira vez, a humanidade enfrenta um ”escondido inimigo”, um vírus mortal, que desafia a nossa capacidade global de manter a vida, e ao mesmo tempo, se depara com vários comportamentos negacionistas, suicidas, é hora de revisar a nossa fé’, no futuro, qualquer que seja, aqui mesmo, ou em outros planos transcendentais.
A imprevisibilidade da vida, e os riscos decorrentes, a sensação da profunda solidão, entre os bilhões de astros e galáxias, a consciência crescente da inutilidade das formas destrutivas do consumo dos bens e serviços, nos impõe retornar o pensamento, que abandonado pelos brilhos da tecnologia, colocou em dúvida o sonho de um progresso incessante, onde todos ou melhor uma parte da humanidade poderia desfrutar do paraíso, nesta vida.
Aos bilhões dos restantes, a grande maioria, restaria e caberia acreditar, que após a morte, lhe seja oferecida uma pequena parte destas delícias, que compense os sofrimentos- corporais e mentais-vividos em suor e lágrimas, na terra.
Sobra-nos uma pergunta; superada ou vencida a pandemia atual do Coronavirus,
como quando finalizadas as grandes guerras e as epidemias mundiais, estaremos comemorando em festas, esta vitória de Pirro sobre o vírus, logo voltaremos, esquecidos e recolhidos em nossos pequenos mundos, isolados dos outros, a se contentar com a vida banal? Ou nos tornaremos, mais atentos e solidários, conscientes de nossos limites pessoais e da humanidade, de nossos corpos e espíritos e dos recursos do seu limitado abrigo terrestre, se esforçando, neste instável infinito, a fazer de nós, melhores, do mundo, menos desigual e mais feliz, em uma relação mais fraterna entre o os povos e com a natureza?
Tenho minhas dúvidas.
Kleber Frizzera
Março 2021
Kleber Frizzera
Arquiteto, professor do Departamento de Arquitetura e Urbanismo da Universidade Federal do Espírito Santo (Ufes).